quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Reflexões sobre a obrigação de transmitir a Voz do Brasil

Por Ericson Meister Scorsim

“Mais que nunca se torna necessário reformular o problema da liberdade como uma dimensão do pensamento e da ação humana, e, em particular, o da liberdade política, cuja função primordial, em nossa época, consiste ‘em preservar a pluralidade’, sem a qual a liberdade não chega sequer a constituir um problema".


I. Contorno do problema

O programa de rádio Voz do Brasil foi instituído à época da ditadura Vargas, precisamente pelo Decreto-lei 1.915/39. A única voz que se ouvia era a do chefe soberano, pois o Congresso Nacional encontrava-se fechado. Originariamente, chamava-se A Hora do Brasil. Depois, a obrigatoriedade de retransmissão do programa oficial de notícias foi incorporada no Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117, de 27.08.62).

Com efeito, tal dever imposto às emissoras de rádio privadas está contido no artigo 38 da Lei 4.117/62:

“Art. 38 Nas concessões, permissões ou autorizações para explorar serviços de radiodifusão, serão observados, além de outros requisitos, os seguintes preceitos e cláusulas:

(...)

e) as empresas de radiodifusão, excluídas as de televisão, são obrigadas a retransmitir, diariamente, das 19 às 20 hs, exceto aos sábados, domingos e feriados, o programa oficial de informações dos Poderes da República, ficando reservados trinta minutos para divulgação do noticiário preparado pelas duas Casas do Congresso Nacional”.



Cumpre destacar que, em determinado período, a então Radiobrás resolveu flexibilizar a divulgação da Voz do Brasil, permitindo horários diferenciados para sua retransmissão, principalmente nos centros urbanos onde as pessoas se encontravam presas no trânsito. Igualmente, a prerrogativa foi estendida para a transmissão de jogos de futebol e festas religiosas. Entretanto, em razão de inúmeros abusos quanto à liberalização da transmissão em horários alternativos, o Senado Federal determinou que a Radiobrás mantivesse a Voz do Brasil no horário tradicional. Ademais, o Congresso Nacional chegou a mobilizar-se em prol de uma emenda constitucional que validasse a exigência da Voz do Brasil. Felizmente, tal absurdo jurídico não foi aprovado. Tal obrigação legal está sendo questionada na Justiça pelas emissoras de rádio que argumentam no sentido de sua não recepção pela Constituição de 1988.

A jurisprudência é controvertida quanto à interpretação do dever de retransmissão da Voz do Brasil, imposto pela Lei 4.117/62, à luz da Constituição de 1988. A maioria das decisões é favorável à manutenção da retransmissão compulsória do programa Voz do Brasil. Contudo, há decisões em favor da obrigatoriedade, com uma pequena diferença, algumas admitem a flexibilização no horário de retransmissão, facultando à emissora de horário escolher um horário alternativo, diferente das 19h às 20h. Com efeito, algumas decisões judiciais representam um grande avanço democrático na medida em que possibilitam a retransmissão da Voz do Brasil em horário diferente das 19h às 20h.

Fonte: http://www.conjur.com.br/2008-set-16/reflexoes_obrigacao_transmitir_voz_brasil