sábado, 13 de fevereiro de 2016

As putas tristes de Gabo



    O realismo fantástico de Gabriel Garcia Márquez sempre me fascinou. Quando li duas vezes ‘Cem Anos de Solidão” (que lhe rendeu o prêmio Nobel de literatura) confesso que fiquei por um bom tempo pensando como um ser humano poderia escrever aquilo: misturar conflitos sociais, tradicionalismo, historias sobrenaturais e muito lirismo. Como disse uma vez um professor do mestrado, “depois de ‘Cem Anos de Solidão’ ele podia ir tomar uma cerveja porque já tinha cumprido sua missão”.
     Não tiro a razão do meu professor! Mas ainda bem que Gabo continuou e nos trouxe em 2005 um livro que definitivamente ia marcar minha vida enquanto amante da literatura. “Memória de Minhas Putas Tristes” nasceu sem o peso da literatura erudita. O que poderia ser apenas a história do desejo de um homem que faz 90 anos e quer passar a noite do seu aniversário com uma menina virgem, traz em cada parágrafo um Gabriel Garcia Márquez mais surpreendente.
     Opa! Muita calma nessa hora...  Antes que os puritanos da plantão chamem de “velho nojento!” O personagem (que é jornalista, escritor e nem nome tem) pede a dona do cabaré, Rosa Cabarcas, que realize seu desejo. Uma menina de 14 anos é designada, mas, ao se encontrar com a garota, o escritor desenvolve uma relação muito diferente da que ele havia planejado. Pela primeira vez, em toda sua vida, descobre o que é dormir com uma mulher sem a necessidade do sexo. Ele simplesmente não consegue tocá-la e esse amor tão platônico faz com que sua velhice seja mais significativa que todo o resto de sua vida de aventuras.
     Esse trecho do livro (que é um dos preferidos de toda minha vida) representa tudo o que sempre esperamos do amor, mas que Gabo conseguiu que uma menina de 14 anos, adormecida e intocada fosse merecedora:

“Havia achado, sempre, que morrer de amor não era outra coisa além de uma licença poética. Naquela tarde, de regresso para casa outra vez, sem o gato e sem ela, comprovei que não apenas era possível, mas que eu mesmo, velho e sem ninguém, estava morrendo de amor. E também percebi que era válida a verdade contrária: não trocaria por nada neste mundo as delícias do meu desassossego. Havia perdido mais de quinze anos tratando de traduzir os cantos de Leopardi, e só naquela tarde os sentia fundo: Ai de mim se for amor, como atormenta."


       Salve, Salve Gabo!!!

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Rumo ao abismo? Pensando com Edgar Morin sobre mitos e futuro

Já ouvi de muitos especialistas que desenvolvimento econômico e progresso social nem sempre andam juntos. Confesso que tenho pensado muito nisso já que, em tese, um deveria servir de suporte para o outro. Nas leituras que tenho feito sobre o assunto, tenho me deparado com reflexões importantes sobre o futuro e como o modelo de desenvolvimento ‘mensurável’ é um dos responsáveis por tantas crises no mundo contemporâneo.
Edgar Morin, no seu livro “Rumo ao abismo? Ensaio sobre o destino da humanidade” nos dá um panorama para pensar – e muito – no que temos hoje. Há um grande perigo que nos ronda: os desenvolvimentos da ciência, da técnica, da indústria e da economia não são regulados pela ética. Isso traz mais problemas do que imaginamos. Morin é muito categórico ao dizer que temos que mudar o rumo, efetuar um novo começo: “A porta para o improvável está aberta, mesmo se atualmente o crescimento do caos torna-lo inconcebível”.  
É importante destacar aspectos da modernidade que são antagônicos e complementares. Por exemplo, temos uma ciência contemporânea que depende da verificação, mas, sobretudo, do conflito de ideias. Falamos em globalização, mas há fenômenos dialéticos onde o local se torna preponderante e há rejeição dessa hegemonia ocidental.
O humanismo moderno é fruto de uma simbiose entre a ideia grega de indivíduos depositários de razão e à concepção cristã de um homem à imagem de um Deus bíblico. O individualismo é uma característica chave. Morin, ainda nos provoca ao determinar que a modernidade se manifesta por meio de três grandes mitos: do domínio universal, do progresso e da felicidade.  
Sabe porque a felicidade está em crise? Porque hoje há uma compreensão de que o resultado positivo da felicidade e os subprodutos negativos aparecem na mesma intensidade: fadiga, abuso de psicotrópicos, drogas...etc. O individualismo também gera solidão, tristeza. O desenvolvimento poderia trazer segurança, mas, na verdade, não elimina riscos e ainda produz novos.
Mas o que fazer então? Morin, diz que temos a emergência de uma sociedade – mundo onde esse desenvolvimento que não leva em consideração a vida, o sofrimento, a alegria, o amor, não tem espaço. Precisamos de uma política que tenha a missão mais urgente de solidarizar o planeta.
O vencedor do Prêmio Nobel da Paz, em 2005, Mohamed Elbaradei, também nos dá um alerta para a necessidade urgente de mudar os paradigmas de desenvolvimento. No seu livro “A era da ilusão: a diplomacia nuclear em tempos traiçoeiros”, tenta abrir os olhos da humanidade para a insanidade que rege as ameaças nucleares. “Na era da globalização, é mais evidente do que nunca que essas inseguranças são ameaças sem fronteiras.”

Sim.... em que mundo estamos vivendo e, o pior, que futuro estamos construindo?